A história de Ponciá Vicêncio descreve os caminhos, as andanças, as marcas, os sonhos e os desencantos da protagonista. A autora traça a trajetória da personagem da infância à idade adulta, analisando seus afetos e desafetos e seu envolvimento com a família e os amigos. Discute a questão da identidade de Ponciá, centrada na herança identitária do avô e estabelece um diálogo entre o passado e o presente, entre a lembrança e a vivência, entre o real e o imaginado.
É o segundo livro da Conceição Evaristo que eu leio e estou sofrendo para fazer a resenha, assim como no primeiro. Em Olhos d'água não consegui avançar com minhas impressões e acabei nunca terminando a resenha. Com Ponciá quero mudar isso.
Sendo basicamente um romance de formação, acompanhamos Ponciá desde o nascimento, mesmo que sua vida não nos seja passada de forma linear. Ela tem problemas com a própria identidade, vive das lembranças, não entende (ou sabe até demais) sobre o futuro e a autora passa essa confusão e desesperança muito bem. Ela cultivou um sonho, objetivo que não se mostra tão fácil assim de alcançar.
Luandi, irmão de Ponciá, passa também por suas desilusões e me tocava muito a admiração que ele tinha pelo soldado que o acolheu. Interessante como ver outra pessoa como você ter algum tipo de "sucesso" dá esperança, cria determinação para aquele que somente conhecia a vida pelas lentes dos brancos. Algumas vezes ele entendia esse status do amigo de forma muito literal, porém é compreensível o porquê. A realidade dele, como homem negro que trabalha desde a infância, é uma labuta jornadas desumanas e raras folgas, ter alguém como ele sendo respeitado e valorizado minimamente parece o maior dos avanços.
Os apontamentos sobre as diferenças entre as terras dos brancos e a terra dos negros foi interessante e mostra bastante a diferença de tratamento, de acesso a determinados recursos e, ainda mais, como mesmo após libertos, os antigos escravizados ainda são tratados e obrigados a seguir praticamente na mesma. Muito das atitudes de Ponciá para mim parecia depressão frente a uma realidade quase imutável, a qual a afasta das melhores partes de si mesma e a joga nas poucas lembranças boas.
A escrita da Conceição é poética, emocional e não procura vilões, mas sim motivos e estruturas que fomentam o presente. Entendi todos os elogios ao livro e fiquei feliz em ter feito essa escolha para a #LeituraPreta de Julho.
Sobre o livro:
ISBN: 9788534705318
Autora: Conceição Evaristo
Editora: Pallas
Ano: 2017
Páginas: 120
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