Um romance do autor de Branca como leite, vermelha como sangue. A escola chegou ao fim, e o verão se abre à frente de Federico, tal como Palermo, sua deslumbrante e misteriosa cidade. Enquanto se prepara para estudar em Oxford, o garoto de 17 anos encontra 3P, o professor de religião, padre Pino Puglisi. Ele não se ofende, sorri. 3P o convida a ajudá-lo com as crianças do seu bairro antes que ele viaje.
Quando Federico atravessa a passagem de nível que separa Brancaccio do restante da cidade, ainda não sabe que nesse exato instante começa sua nova vida, a verdadeira. À noite, volta para casa sem bicicleta, com os lábios arrebentados e a sensação de ter descoberto uma realidade totalmente estranha, mas que lhe concerne de perto.
É o emaranhado de ruelas controladas pela Cosa Nostra. É também onde moram muitos que não renunciam à esperança de uma vida que os leve tão longe quanto a bola que recebe um chute muito forte. Seu romance de estreia, Branca como o leite, vermelha como o sangue (2011) inspirou o filme homônimo, realizado dois anos mais tarde. É também autor de Coisas que ninguém sabe, publicado pela Bertrand Brasil em 2013.
Comecei o livro bem empolgada, afinal é do Alessandro D'Avenia, e não me decepcionei. Talvez não esperasse encontrar um enredo com tantas questões sérias, nem que tivesse sua cota de personagens verídicos, mas não me decepcionou em nenhum momento. Que saudade da sensibilidade e competência do autor!
Embora tenha em Federico um adolescente as voltas com sua paixão, o livro não tem como foco o romance. Na verdade, me parece só mais um meio de mostrar a alienação de classes mais abastadas sobre comunidades mergulhadas em diferenças sociais, e só me fez ter mais certeza que é um problema global. Federico tinha uma vida bem organizada, com os problemas típicos da sua idade, mas nada que o fizesse refletir muito, apesar da sua evidente forma de pensar diferente. Engraçado que é sua amizade com padre Pino que começa a abrir seus olhos para situações das quais ele não sabia existir. E foi gradual, sem forçar a barra, que o autor nos mostra sua evolução.
O Padre Pino com certeza é a melhor pessoa do livro. Sua força, sua esperança e garra, sua busca incessante por uma vida digna para os moradores de Brancaccio é admirável. Mesmo sendo um homem de fé, ele tem sim seus próprios questionamentos, mas não se deixa abater. O capítulo que mais fala sobre suas fraquezas e sua fé é maravilhoso, não consegui marcar frases que me agradassem, marquei o capítulo de tão intenso que foi.
Outros personagens ajudam a dar forma ao livro, como Lúcia, Riccardo, Dario, Maria, a menina com a boneca... Tantas vidas tocadas e interrompidas pela falta de perspectivas, tantas oportunidades perdidas, tanta força para lutar. Cada um passou sua mensagem, de desespero e de esperança, e me cativaram bastante.
Foi uma experiência muito boa ver a mudança de ponto de vista e de narrativa. Quando Federico era o foco, a descrição era em primeira pessoa e quando Padre Pino tinha a voz, era em terceira. Alguns outros personagens aparecem seguindo a mesma forma narrativa do Padre. Cada visão diferente só reforçava a interação do leitor com o enredo.
Falar de livro do D'Avenia é falar de poesia. Desde o primeiro livro dele que li - Branca como leite, vermelha como sangue - esse aspecto é presente, porém senti com mais intensidade em "O que o inferno não é". A forma que ele escreve, que passa os sentimentos me atingiam sem esforço nenhum. Sempre me via envolvida pelos acontecimentos, torcendo pelo personagens e ficando triste a cada batalha perdida. Como disse antes, eu não conseguia marcar somente frases, marcava capítulos. Espero não ter que esperar muito por outro livro do autor.
Sobre o livro:
ISBN: 9788528621631
Autor: Alessando D'Avenia
Editora: Bertrand Brasil
Ano: 2017
Páginas: 384
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