Combinando humor e romance, Connie Willis, ícone da ficção científica, entrega um livro envolvente sobre os perigos da tecnologia, do excesso nas redes sociais e... do amor. Em um futuro não muito distante, um simples procedimento cirúrgico é capaz de aumentar a empatia entre os casais, e ele está cada vez mais na moda. Por isso, Briddey Flannigan fica contente quando seu namorado, Trent, sugere que eles façam a cirurgia antes de se casarem — a ideia é que eles desfrutem de uma conexão emocional ainda maior, e que o relacionamento fique ainda mais completo. Bem, essa é a ideia. Mas as coisas acabam não acontecendo como o planejado: Briddey acaba se conectando com outra pessoa, totalmente inesperada. Conforme a situação vai saindo do controle, Briddey percebe que nem sempre muita informação é o melhor, e que o amor — e a comunicação — são bem mais complicados do que ela esperava.
Interferências é minha segunda experiência com a escrita da Connie Willis, autora de "O livro do juízo final". Os dois livros são muito diferentes tanto em tema como em abordagem e, mesmo com alguns percalços, consegui me divertir.
A maior questão que o livro levanta é sobre o excesso de comunicação e os meios pelos quais ela se dá. O tipo de procedimento que Briddey e Trent se propõe a fazer é uma das coisas que exemplificam esse ponto. Imagina não precisar se expressar para seu par porque ele sente seus sentimentos? Pode parecer bom a primeira vista, mas será que vocês gostariam mesmo de não ter a opção de guardar pra si seus sentimentos? De não ser decisão sua expô-los? Eu nunca me adaptaria a isso, e não vejo como melhoraria um relacionamento, penso justamente o contrário: seria uma grande prova de falta de confiança necessitar da cirurgia para compartilhar algo com seu parceiro.
Esses questionamentos se dão enquanto a empresa que os dois trabalham tenta desenvolver um celular melhor que a Apple e essa discussão permeia o livro todo, e vamos entendendo os prós e os contras, e desenvolvemos nossa própria opinião sobre o tema. Também conhecemos melhor nossos protagonistas e os personagens que reforçam essa reflexão.
E eles são nosso meio de ver diferentes perspectivas e com C.B. observamos a importância de ter seus próprios momentos, de não estar sempre ao alcance de todo mundo. Foi um personagem maravilhoso de muitas maneiras, gentil e inteligente, e gostei das várias camadas que a autora dá a ele. As irmãs da Briddey me davam nos nervos: a Marie Clare por ser uma mãe obsessiva e com interpretações malucas sobre as ações da filha, e a Kathleen pela busca constante de companhias nada saudáveis em aplicativos nem um pouco seguros. A Maeve, sobrinha da Briddey, me despertava sentimentos opostos: amava em alguns momentos e, em outros, pensava que não faria mal que ela não aparecesse no livro.
Um ponto negativo pra mim é a demora para o enredo engrenar. O começo do livro poderia ser menor, porque, basicamente, se passam coisas que poderiam ser descritas de uma maneira mais dinâmica, que não parecesse tão arrastada. Não sei se essa impressão minha está ligada a aversão que eu sentia pela falta de privacidade que a vida da Briddey sofria, com a família se metendo em tudo, ou os colegas de trabalho que faziam o mesmo, mas sofri um pouco. E Briddey também demorou um pouco para me fazer torcer por ela, pois deixava muito das suas próprias decisões nas mãos dos outros, mas vai melhorando com o passar das páginas.
Mas passada essa parte inicial, eu amei o livro. Tornou-se uma leitura que, além de divertida e cheia de momentos emocionantes, deixava minha curiosidade sempre aguçada. O provável casal me conquistou, então fiquei torcendo muito por eles e pela resolução dos problemas tão inesperados que eles enfrentam. A Connie Willis sabe como deixar o leitor ansioso, seja qual for a história, e seus personagens conseguiram me conquistar nos dois livros lidos. Será que veremos mais dela aqui no Brasil?
Sobre o livro:
ISBN: 9788556510570
Autora: Connie Willis
Editora: Suma de letras
Ano: 2018
Páginas: 464
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