A guerra está no coração do Império Nikara, e o ópio corre em suas veias. No passado, os heróis que formaram a Trindade uniram a nação contra a poderosa Federação de Mugen, e acreditava-se que eles caminhavam entre os deuses.
Décadas depois, a paz reina, mas há boatos de que a Terceira Guerra da Papoula pode estourar a qualquer momento, e a academia militar mais prestigiada do Império prepara seus estudantes para o combate: filhos da elite e, inesperadamente, uma órfã de guerra.
Obrigada a se casar com um homem asqueroso, a jovem Rin fez de tudo para reescrever o próprio destino. Estudou para o exame imperial por pura teimosia e, quando conseguiu uma vaga na academia, acreditou estar salva.
Mas ela logo aprende que uma garota pobre e de pele escura não tem muito valor naquele lugar. Hostilizada pelos professores e colegas, Rin treina com afinco. Com a ajuda de um mestre excêntrico e de substâncias psicoativas, a jovem passa a cultivar poderes xamânicos e a acessar a força incandescente de uma deusa vingativa, a perigosa Fênix.
Quando o conflito com o país vizinho eclode, Rin entende que, para ganhar a guerra, talvez tenha que perder sua humanidade.
Em A Guerra da Papoula, R.F. Kuang constrói com maestria um universo de deuses e monstros inspirado na Segunda Guerra Sino-Japonesa, na história militar da China no século XX e na ascensão de Mao Tsé-Tung ao poder. Considerado uma das 100 melhores fantasias de todos os tempos pela revista Time, o livro é uma história brutal e comovente sobre uma jovem que deseja salvar sua nação a qualquer custo e as consequências devastadoras da guerra.
Participei de um desafio em Maio chamado MAYsian e na lista de livros que fiz, A guerra da Papoula era uma das escolhas. Não achava possível começar e terminar a tempo, porém o enredo me fez pegar o livro e soltá-lo pouquíssimas vezes. O caminho não foi fácil, contudo. A realidade grosseira e cruel de uma guerra se fez presente e foi vívido demais.
Rin tem toda uma carga emocional de quem busca a sobrevivência desesperadamente. Uma vida de trabalho para pessoas interesseiras, o convívio nítido com os efeitos do ópio e a possibilidade disso piorar por decisões alheias à ela são pontos inegáveis da coragem necessária para tomar decisões difíceis e elas somente aumentam de importância e intensidade. Eu adoro como a autora a constrói como alguém que precisa desenvolver laços com as pessoas ao mesmo tempo que leva tantos tombos que desconfia da maioria das pessoas que a cercam.
A autora não poupa ninguém de sofrimento e dor. Como em qualquer guerra, inocentes sofrem os mais diversos tipos de crimes e a crueldade que eles recebem está presente em vários momentos. Em determinada altura do enredo tem referência às mulheres de conforto e fica muito claro quando isso ocorre.
Aliás, referências e críticas não faltam. Temos vários momentos onde Rin sofre preconceito por sua cor mais escura e pela falta de poder econômico. Como toda a sociedade atual, quem tem dinheiro consegue se safar de situações que deveriam ser responsabilizados e, quando a pessoa com menos recursos somente se defende, é tratada pior da pior forma. Quando as pessoas que deveriam proteger você e o povo é justamente que os manda para a morte. O jogo político também está sempre presente e nos momentos mais inoportunos.
Ainda sim, é um contexto de guerra e situações extremas acontecem a todos, ricos ou pobres. Algumas dessas demonstrações me quebraram totalmente porque ia me apegando aos personagens e logo me despedindo, às vezes temporariamente, outras, definitivamente.
Cada perda que atinge Rin, cada descoberta perturbadora feita por ela, causa confusão, dor e revolta, além de tornar combustível para a determinação e sede de vingança da protagonista. Ela é o tipo de personagem que eu amo acompanhar: acerta e erra, não é exatamente boa - nem sei se com a vida dela isso seria possível - mas não chega nem perto de ser má. E é tão bom ler esse tipo de contradição, de concordar e refutar os caminhos que ela escolhe nas opções reduzidas que tem.
Se alguém espera romance nesse primeiro volume, já digo que será em vão. Tem sentimentos românticos em evidência em alguns momentos, mas são raros e muito misturados com o contexto da Rin onde eles não são uma prioridade. Por mais que eu ame quando encontro um par por quem torcer, não acho que fez falta, só deixou ainda mais real e solitária uma situação crítica.
Gostei da escrita da autora, de como dosou os acontecimentos, a forma que descreve os sentimentos da Rin, toda a parte fantástica onde temos conceitos da cultura asiática, e de como não teve medo de expor o que achava parte importante para o leitor entender a gravidade de tudo. Da forma que terminou o primeiro sem ter pena da gente e que me deixou maluca pela segunda parte. E gente, não deixem de considerar os avisos de leitura. Tem muita violência e de várias formas e níveis, abuso de substâncias e sexuais, e tudo muito verdadeiro. Pense nos seus limites antes de decidir ler.
Sobre o livro:
ISBN: 9786555604344
Série: A guerra da Papoula
Volume: 01
Autora: R. F. Kuang
Tradução: Ulissses Teixeira
Editora: Intrínseca
Ano: 2022
Páginas: 512
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