A escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie vem conquistando um público cada vez maior, tanto no Brasil como fora dele. Em 2007, seu romance Meio sol amarelo venceu o National Book Critics Circle Award e o Orange Prize de ficção, mas foi com o romance seguinte, Americanah, que ela atingiu o volume de leitores que a alavancou para o topo das listas de mais vendidos dos Estados Unidos, onde vive atualmente. Ao trabalho de ficcionista, somou-se a expressiva e incontornável militância da autora em favor da igualdade de gêneros e raça. Agora é a vez de os leitores brasileiros conhecerem a face de contista dessa grande autora já consagrada pelas formas do romance e do ensaio. Publicado em inglês em 2009, No seu pescoço contém todos os elementos que fazem de Adichie uma das principais escritoras contemporâneas. Nos doze contos que compõem o volume, encontramos a sensibilidade da autora voltada para a temática da imigração, da desigualdade racial, dos conflitos religiosos e das relações familiares. Combinando técnicas da narrativa convencional com experimentalismo, como no conto que dá nome ao livro — escrito em segunda pessoa —, Adichie parte da perspectiva do indivíduo para atingir o universal que há em cada um de nós e, com isso, proporciona a seus leitores a experiência da empatia, bem escassa em nossos tempos.
Ler algo da Chimamanda é sempre um prazer. Não porque os temas são leves e a história bonitinha, muito pelo contrário. A veracidade contida neles nos presenteia com um dia a dia o qual eu não estou acostumada a ler, nem a acompanhar. Neste livro de contos, a autora passa por diversos assuntos pertinentes a sua origem e a maneira com que os cidadãos nigerianos se relacionam com uma cultura diferente como a americana.
Muito da própria experiência da autora é encontrada em 'No seu pescoço". Como ela estudou um tempo nos Estados Unidos vivenciou bastante as diferenças culturais, o preconceito e até mesmo o exagero das qualidades do país pelos imigrantes. Esse último aspecto pode ser observado no conto "Os casamenteiros" e "Réplica", que também tem outro ponto em comum: a mulher dentro da sociedade nigeriana. Claro que podemos ver o papel da mulher em outros contos, como em "No seu pescoço" - um dos meus preferidos do livro - e "A historiadora obstinada".
"A historiadora obstinada" talvez seja o conto que mais transmite a raiz da cultura nigeriana e a chegada dos estrangeiros. Nwamgba é uma mulher forte, com objetivos claros e que acaba vendo nas mudanças que os homens brancos trazem uma forma de fortalecer o filho, porém os novos hábitos tem consequências bem diferentes das quais ela gostaria. O choque cultural é evidente, e muito das tradições do povo é considerada ilegítima pelas novas religiões, e a autora enfatiza bem esse ponto, o que me lembrou de "Hibisco roxo", outro romance dela.
O aspecto político tem presença marcada em "Cela um", "Fantasmas" e "A embaixada americana", em especial na luta dos estudantes e professores durante o golpe, e na importância na imprensa no meio do conflito, além de apresentar falhas em ambos os lados da guerra.
Gostei especialmente do conto "O tremor". Me identifiquei com algumas das reflexões que a personagem fazia sobre seu relacionamento, embora as ações dela se diferenciassem bastante das minhas. A amizade que Ukamaka e Chinedu desenvolvem passa por algumas fases em um curto tempo, mas são suficientes percebemos a mudança em ambos e a confiança crescendo entres os dois nigerianos numa faculdade dos Estados Unidos.
E desafio vocês a lerem "Jumping Monkey Hill" e não terem raiva.
A autora difere os contos não somente pela história e seus personagens: ela muda o estilo e experimenta formas de sentirmos o momento, mudando os pontos de vista e temas. Sua escrita ainda é seu maior trunfo, impossível não perceber a profundidade do seu trabalho e escolha de temas. Sempre acabo um livro dela querendo mais, e não foi diferente dessa vez.
Sobre o livro:
ISBN: 9788535929454
Autora: Chimamanda Ngozi Adichie
Editora: Companhia das Letras
Ano: 2017
Páginas: 240
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