segunda-feira, 21 de agosto de 2017

RESENHA: As coisas que perdemos no fogo

Macabro, perturbador e emocionante, As coisas que perdemos no fogo reúne contos que usam o medo e o terror para explorar várias dimensões da vida contemporânea. Em um primeiro olhar, as doze narrativas do livro parecem surreais. No entanto, depois de poucas frases, elas se mostram estranhamente familiares: é o cotidiano transformado em pesadelo.
Personagens e lugares aparentemente comuns ocultam um universo insólito: um menino assassino, uma garota que arranca as unhas e os cílios na sala de aula, adolescentes que fazem pactos sombrios, amigos que parecem destinados à morte, mulheres que ateiam fogo em si mesmas como forma de protesto, casas abandonadas, magia negra, mitos e superstições.
Uma das escritoras mais corajosas e surpreendentes do século XXI, Mariana Enriquez dá voz à geração nascida durante a ditadura militar na Argentina. Neste livro, ela cria um universo povoado por pessoas comuns e seres socialmente invisíveis, cujas existências sucumbem ao peso da culpa, da compaixão, da crueldade e da simples convivência. O resultado é uma obra ao mesmo tempo estranha e familiar, que questiona de forma penetrante e indelével o mundo em que vivemos. 

"As coisas que perdemos no fogo" foi uma leitura bem diferente para mim. Minha imagem mental sobre Buenos Aires é certamente mais romântica, muito parecida com as descrições de Fernando Schell em "O amor segundo Buenos Aires", então encontrar a cidade na visão de Mariana Enriquez me surpreendeu. 

Todos os contos deste livro tem uma veia triste, com situações tensas e muitas vezes macabras, que me deixaram sempre atenta esperando o pior acontecer. Muitos deles são ambientados em locais pobres ou onde pode ser observado abandono, viciados em drogas e violência, e as histórias poderiam se passar facilmente no Brasil tamanha a semelhança com nossa realidade.

Alguns contos me incomodaram muito, não por serem ruins, e sim por ser difícil para mim ler qualquer coisa com maldade em relação à crianças, mas é uma realidade, e a autora não poupa o leitor desses acontecimentos. O destaque que ela dá as personagens femininas me agradou bastante, a maioria é muito forte em suas convicções, e vemos isso no conto que dá nome ao livro e enfatiza a luta ainda necessária das mulheres por direitos que deveriam ser o básico e justiça.

A crítica social, aliás, está tão presente nas histórias quanto o terror. Corrupção da justiça e policiais, irresponsabilidade de abrigos de crianças, assassinato de mulheres que não querem mais continuar o casamento, todos esses temas são encontrados e narrados pela escrita envolvente da Mariana, que tem o dom de deixar o leitor curioso sobre os personagens e enredo. Gostei muito da leitura e vou ficar atenta para outros livros da autora. 

Sobre o livro:
As coisas que perdemos no fogo
ISBN: 9788551001448 
Autora: Mariana Enriquez
Editora: Intrínseca
Ano: 2017
Páginas: 192

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