terça-feira, 3 de novembro de 2020

RESENHA: Cartas para Martin

Justyce McAllister é um garoto de dezessete anos com um futuro brilhante pela frente. É um dos melhores alunos de uma prestigiada escola de Atlanta, tem uma mãe amorosa e um melhor amigo incrível. No entanto, um episódio de violência policial traz à tona que a distância entre ele e seu futuro é quase um abismo. Porque Justyce McAllister é negro, e isso significa que, muitas vezes, é julgado pela cor de sua pele.
Ao ser agredido e detido injustamente, o olhar de Justyce desperta para um novo mundo, um lugar solitário em uma sociedade que insiste em vê-lo como ameaça ou como promessa de fracasso. Ele se dá conta, então, de que não pode mais fingir que não tem nada errado e decide iniciar um projeto: escrever cartas para Martin Luther King Jr., um dos mais importantes ativistas políticos pelos direitos dos negros, símbolo da luta contra a segregação racial nos Estados Unidos, morto em 1968.
Ao tentar aplicar os ensinamentos de Luther King em sua vida, Justyce começa a trilhar um caminho para entender não só como deve reagir diante das injustiças, mas que tipo de pessoa ele quer ser. Em meio a questões familiares, desentendimentos com os amigos e complicações da vida amorosa, nas cartas ele expõe suas dúvidas, sua angústia, sua revolta e a percepção clara de que a sociedade não é tão igualitária quanto deveria.
No livro de estreia de Nic Stone, vemos Justyce passar pelos desafios da adolescência, amadurecer e encarar o racismo que tanto afeta sua existência. Comovente e extremamente necessário, Cartas para Martin é um relato sobre ser um jovem negro e sobre o direito inalienável de existir. Um livro impossível de ignorar.

Esse livro entrou para minha lista desde que a Intrínseca anunciou que iria publicá-lo. Gostei da sinopse, do nome do livro, e queria muito saber como seria o enredo. Fico muito feliz por ter amado tudo e triste por ver o quanto é real tudo que acontece.

Doloroso. Essa palavra resume bem o sentido do livro para mim. Porém também o resume revolta, injustiça e tristeza. Difícil ver cada problema surgindo na vida do Justyce (nome melhor para o personagem não há) e não sentir tudo isso, em especial porque ele não fez nada para merecê-los. As cartas escritas por ele para Martin Luther King são incríveis e dizem muito sobre suas dúvidas e sentimentos. 

Dói também saber ser tão real tudo o que ele passa. Desde a prisão arbitrária, o tratamento dos colegas de escola, até o acontecimento mais trágico. A maneira como a sociedade, a mídia e a justiça tentam culpá-lo é criminosa, e ninguém liga porque já o colocaram no grupo dos culpados somente por sua cor. Conseguimos ver isso claramente na vida real: Breonna Taylor, George Floyd e tanto outros estão aí para nos mostrar. 

E o livro trata essas questões de maneira crível porque é realmente o que encontramos quando casos como o de Justyce acontecem. Vemos a maneira como ele vira bode expiatório para os erros do sistema, como os colegas são racistas com a desculpa que ele e o Manny são seus amigos e não fazem "drama", como sempre tentam justificar ações mais agressivas dos brancos com uma raiva inerente aos negros. 

Pior é ver o quando os privilegiados se sentem atacados e prejudicados quando pretos são inseridos em ambientes dos quais eles são a maioria. Jared é um dos personagens que mais me deixou chateada nesse sentido porque mesmo tendo tanto acesso a educação e informações, não sai de sua bolha e enxerga o Justyce como alguém muito abaixo do seu nível. Nesse quesito eu bato palmas para a S.J.: cada resposta esquentadinha dela me representava muito. 

A S.J. também é responsável por fazer o Justyce começar a pensar em determinados comportamentos dos seus colegas e até o próprio depois do incidente: ele começa a mudar seu pensamento e fazer algo sobre isso, mesmo que nem sempre da forma mais correta. E seu novo posicionamento também abre os olhos do Manny e as conversas entre eles, assim como com o Doc e o Sr. Rivers exemplificam e guiam seus pensamentos. 

A autora não dá um final bonitinho, nem feliz. Ela dá um final crível e condizente com o apresentado durante toda a narrativa, nos fazendo refletir e ter um pouco de esperança, mas não deixa de pontuar a presença de uma dor que dificilmente irá embora. Nic Stone utiliza uma linguagem acessível e explica pontos importantes dando informações para leitores que talvez não tenham familiaridade com o assunto. Apesar da dor e revolta sempre presentes ao passar as páginas, eu amei a leitura. Me senti representada e, mais ainda, fortalecida. 

Sobre o livro: 
ISBN: 9788551006658
Autora: Nic Stone
Tradutora: Thaís Paiva
Editora: Intrínseca
Páginas: 256





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